Jejum intermitente é sempre um tema controverso, que traz discussões calorosas nas mídias sociais. Há profissionais que o defendem com afinco, enquanto outros o criticam na mesma intensidade. Mas então, há evidência para jejum intermitente? O que a ciência diz sobre ele?
Esse não é um tema de pesquisa novo. Há estudos centenários, inclusive. É só pensar que o Ramadã – uma prática de jejum presente no islamismo – é milenar, e há muitos anos pesquisadores se debruçam sobre o efeito dele sobre a saúde. A diferença é que houve substancialmente mais ensaios clínicos nos anos mais recentes, que são os estudos com maior nível de evidência.
É por isso que quero discutir o artigo “Effects of Intermittent Fasting on Health, Aging, and Disease”, dos pesquisadores Rafael de Cabo e Mark Mattson. Trata-se de uma revisão de literatura que aborda todas as evidências experimentais e clínicas sobre jejum intermitente na saúde. É uma revisão de altíssimo nível, publicada na New England Journal of Medicine (uma das mais importantes do planeta).
De forma geral, os autores mostram que há formação de corpos cetônicos no jejum intermitente, e que eles são utilizados como substrato energético nessa. Só que o que eles mostram é que os corpos cetônicos exercem muito mais funções do que apenas serem oxidados para obter ATP: eles são sinalizadores e moduladores de expressão gênica.
Conforme demonstro nas figuras, a baixa disponibilidade de aminoácidos e glicose (e consequentemente insulina) durante o jejum faz com que as vias do IGF-1 e do mTOR fiquem reduzidas, o que paradoxalmente ativa as vias de autofagia. Autofagia é um mecanismo adaptativo de renovação celular, que protege as células contra erros inatos e adquiridos.
A metabolização dos corpos cetônicos causa alteração nas razões NADH:NAD+ e ATP:AMP, o que gera ativação de AMPK e agindo como cofator de SIRT. SIRT, por sua vez, desacetila os fatores de transcrição FOXO e PGC-1alfa, que assim resultam em biogênese mitocondrial.
Essas vias metabólicas explicam os efeitos clínicos observados, como melhora na resistência à insulina, na capacidade de resistência celular ao estresse, redução de fatores de risco cardiovascular e até mesmo efeitos preliminares que demonstraram melhora cognitiva e na memória.
Dessa forma, há sim evidência para o jejum intermitente. Há quem diga que os benefícios associados ao jejum são, na verdade, derivados da perda de peso em si e não desse estado metabólico. Os autores abordam esse assunto também e demonstram que há vários desses efeitos positivos mesmo sem perda de peso.
Devemos lembrar que não existem evidências de longo prazo ainda, e que também devemos ter critérios ao aplicar essa estratégia – nem todo paciente se adapta, e mesmo os que se adaptam, é preciso ver se o momento da terapêutica favorece a adesão! Adesão é, e sempre deve ser, o objetivo maior.
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